Um bioma muitas vezes visto com preconceito como pobre e estéril, a
caatinga é o foco de estudo de um grupo de pesquisadores de universidades
nacionais e internacionais que está em expedição pela Reserva Ecológica Olho
D'água das Onças, localizada no município de Picuí, no seridó paraibano. A
equipe é formada por nove professores e alunos de graduação e pós-graduação da
Universidade de Brasília, Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
Universidade Federal de Campina Grande, Universidade Federal da Paraíba e Utah
University – Logan, UT. Eles integram o Programa de Apoio a Núcleos de
Excelência (Pronex), financiado pela Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado da
Paraíba (FapesqPB) e pelo Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq).
Os pesquisadores estão capturando espécies para coletar material
genético e tentar avaliar o risco de extinção dessas espécies considerando um
cenário provável de mudanças climáticas. O projeto é intitulado “Passado,
presente e futuro da caatinga: história, ecologia e conservação da herpetofauna
frente às mudanças ambientais”, sendo herpetofauna a população de reptéis e
anfíbios de uma área.
Com os conhecimentos produzidos e divulgados, a ideia é promover a
conservação e uso sustentável da região: identificar padrões e processos da
distribuição espacial e temporal da biodiversidade da caatinga; definir
estratégias e ações; e formar recursos humanos altamente qualificados. O
projeto está orçado em R$ 405.230,00 oriundos do CNPq e do Governo do Estado
por meio da Fapesq.
“Nessa pesquisa a gente vai coletar dados genéticos para identificar
como a distribuição das espécies de hoje em dia e a diversidade genética
refletem nessas barreiras geológicas que existem na caatinga”, disse Daniel
Mesquita, doutor em Ecologia Animal pela Universidade de Brasília (UnB),
professor do curso de Biologia da UFPB e coordenador do projeto. A investigação
vai analisar como as espécies estão interagindo, como se relacionam, do que se
alimentam, quem se alimenta delas, em que época do ano cada espécie se
reproduz, e se as populações estão aumentando ou não. Vai coletar também dados
de parasitas dessas espécies, entre outras informações.
Uma das etapas do estudo em Picuí diz respeito ao mencionado
“futuro da caatinga”: é nela que a pesquisa está mais debruçada no estágio
atual. “Estamos coletando dados de ecofisiologia de anfíbios e répteis,
analisando a temperatura máxima que os bichos podem resistir, para usar modelos
de risco de extinção das espécies”, explica Daniel. “A gente sabe que o tempo
está mudando de forma mais acelerada e essas mudanças têm consequências nas
espécies, devido a limitação de oportunidades de termorregulação, porque o
ambiente está ficando mais quente”. As espécies dependem da temperatura
ambiental para controlar a temperatura do corpo: se fica muito frio ou muito
quente, os animais tendem a ficar ativos por menos tempo. “Daí eles têm menos
oportunidades para se alimentar e para encontrar parceiros e deixam menos
descendentes. Isso pode fazer com que as populações fiquem menores, aumentando
o risco de extinção”, explicou o pesquisador.
Para Roberto Germano, presidente da Fapesq, apoiar pesquisa de
excelência como essa é pensar no futuro das espécies e também das pessoas. “A
preservação do meio ambiente e da biodiversidade é fundamental para a
humanidade, para o bem das gerações futuras. Por isso que a Fundação tem um
olhar atencioso para os grupos de excelência que trabalham com a preservação do
meio ambiente”, ressaltou Germano.
O Pronex prevê coletas em até seis localidades de caatinga. Já
foram coletados dados na Serra Vermelha, no Piauí. O próximo destino pode ser o
Parque Nacional Boqueirão da Onça, na Bahia – outros lugares ainda
estão a definir. O projeto teve início em 2019 e se estenderá até o ano de
2022.
Além de Daniel Oliveira, o grupo de pesquisadores é composto
por: Guarino Rinaldi Colli, doutor em Organismic Biology pela University of
California, de Los Angeles (EUA); Frederico Gustavo Rodrigues França,
coordenador do programa de pós-graduação em Ecologia da UFPB; Victor Hugo G. L.
Cavalcante, professor do Instituto Federal do Piauí (IFPI); Cecília Rodrigues
Vieira, doutora em Biology – Insect Ecology na Utah University, de Logan (EUA);
Paulo Eduardo Silva Bezerra, doutorando em Ecologia Animal pela UFRN; Tayná
Barbosa Ferrari, doutoranda em Ecologia pela UNB; e Gabriel David Moura
Figueiredo, graduando em Ciências Biológicas pela UFPB.
Caatinga ainda é pouco estudada
Apesar dos esforços nas últimas duas décadas, a caatinga ainda é
pouco estudada e sua riqueza ainda subestimada. Mesmo assim são reconhecidas
3.150 espécies de plantas (788 endêmicas). Embora existam cerca de 183 espécies
de mamíferos na caatinga, a riqueza do grupo é relativamente baixa quando
comparada a outros. A avifauna é diversa, com cerca de 548 espécies conhecidas,
distribuídas em 74 famílias, sendo que 91,96% se reproduzem na região.
Para a herpetofauna, atualmente estão descritas para este bioma
cerca de 312 espécies, sendo 79 de lagartos, 10 de anfisbênias, 112 de
serpentes, 10 de quelônios, três de crocodilianos e 98 de anuros (que é a ordem
de sapos, rãs e pererecas). Isso sem contar com os remanescentes de florestas,
como os brejos de altitude e outros tipos de paisagens, que certamente
contribuem muito para o incremento da sua diversidade.
Esses números devem aumentar muito, uma vez que, de acordo com
dados do projeto coordenado por Daniel Mesquita, 40% do bioma nunca foram
investigados, e 80% permanecem sub-amostrados, mesmo com esforços recentes, e
muitos grupos taxonômicos são na verdade complexos de espécies..
Pronex apoia pesquisadores consolidados
O Programa de Apoio a Núcleos de Excelência (Pronex) tem como
objetivo apoiar a execução de projetos de grupos consolidados de pesquisas
científica, tecnológica e de desenvolvimento, dando suporte financeiro à
continuidade dos trabalhos desses grupos. É classificado como Núcleo de
Excelência um grupo de pesquisadores com reconhecida competência e tradição em
suas áreas de atuação, capaz de funcionar como fonte geradora e transformadora
de conhecimento científico-tecnológico para aplicação em projetos de relevância
para o desenvolvimento do país.
Por Helda Suene (Assessoria FapesqPB)
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